terça-feira, 25 de fevereiro de 2014

Jornal Açoriano Oriental: "Repetir votação é possível mas oposição quer responsabilidades"

"A proposta do PS, por indicação do seu presidente, Vasco Cordeiro, de repetir a votação do polémico diploma do concurso docente extraordinário - que deverá integrar em três anos cerca de 300 professores no quadro das escolas açorianas - não tem boa aceitação, na generalidade, dos partidos da  oposição, que querem primeiro que se apurem responsabilidades sobre o que levou à alteração do diploma na sua redação final, para só depois se chegar a um entendimento sobre a melhor forma de resolver este problema. 
Como nunca antes houve uma situação destas no parlamento açoriano, não há no seu regimento nada que permita ou impeça a repetição da votação em plenário, logo que esta seja a vontade da conferência de líderes dos partidos com assento parlamentar.  E este também não é um assunto que diga diretamente respeito ao Representante da República,  que ontem ainda não tinha recebido por correio o diploma original enviado pela Assembleia no passado dia 20. Se entretanto, o Representante da República for informado pelo parlamento açoriano de que a votação deste diploma vai ser repetida, pode simplesmente ‘devolver’ o diploma quando o receber. E só se este der entrada oficial antes de ser notificado, o Representante da República pode iniciar uma avaliação que poderá até acabar com um veto político, que faria neste caso a polémica sair da esfera do parlamento. 
Mas tudo vai depender do que for hoje entendido pelos líderes parlamentares, havendo posições muito diferentes sobre a matéria.  A alteração introduzida no diploma parece ser substantiva, na medida em que altera os critérios da primeira prioridade do concurso. Se a lei diz que os professores têm de ter um determinado tempo de serviço no mesmo grupo docente, ficam de fora dessa prioridade muitos professores que passaram por grupos diferentes nesse mesmo tempo de serviço. Mas se a lei disser, como diz após a alteração, que os professores têm de ser profissionalizados, independentemente de terem um determinado tempo de serviço sempre no mesmo grupo, o universo da prioridade alarga-se substancialmente. Ora, no regimento da Assembleia, a comissão de redação final “não pode modificar o pensamento legislativo, devendo limitar-se a aperfeiçoar a sistematização do texto e o seu estilo, mediante deliberação sem votos contra”. E aqui surge outra polémica. O PS não só entende que nunca foi intenção do legislador criar um critério restrito de grupo na primeira prioridade, pelo que houve um lapso no diploma aprovado em plenário que foi corrigido na sua redação final - aceitando a repetição da votação para que fique claro o que se pretendia votar - como afirma que o PSD, que tem um elemento na comissão de redação final, concordou com essa redação. O PSD nega essa afirmação, garantindo que “não foi tido nem achado” na redação final do diploma, afirmando em comunicado que esta situação “deve ser esclarecida em primeiro lugar no local próprio, o parlamento dos açorianos” não assumindo, por isso e antes da conferência de líderes de hoje, uma posição sobre a intenção de repetir a votação. 
Bastante críticos, com a exceção do PCP, são os restantes partidos da oposição. Para Artur Lima, do CDS-PP, as preocupações do PS e do seu presidente e também presidente do Governo deveriam ser a da “defesa da democracia e do cumprimento da lei”, considerando este um caso de “falsificação” de um documento da Assembleia que “nem na Madeira, com todas as críticas que o PS costuma fazer ao seu parlamento, se terão passado enormidades deste tamanho”. Repetir a votação, para Artur Lima, é por isso apenas “legalizar um crime” pelo que no seu entender deverá ser agora o Representante da República a pronunciar-se sobre ele. 
Em declarações à Rádio Açores/TSF,  Zuraida Soares, do Bloco de Esquerda (BE), considera que a repetição da votação não é uma forma de dignificar o parlamento açoriano, mas sim “a maneira de branquear um comportamento ilícito, mal explicado e feito à revelia dos deputados”. Para Zuraida Soares, impõe-se assim “clarificar o processo, responsabilizar quem tem de ser responsabilizado e garantir que não se voltem a repetir dentro da nossa assembleia este tipo de situações”, para que a “confiança no parlamento seja restaurada”. 
Para Paulo Estêvão, do PPM, está-se perante a “falsificação  de uma decisão do parlamento” por uma “mão invisível” que envia para o Representante da República a versão de  uma lei que não foi a aprovada pelo parlamento açoriano.  Paulo Estêvão entende também que esta polémica levanta uma “questão grave” - que Zuraida Soares também coloca - dos “açorianos  não saberem se o que é aprovado no parlamento de uma forma clara e à vista de todos é depois alterado”. 
O PPM já está a fazer uma investigação no sentido de apurar eventuais outras situações em que possam ter sido introduzidas alterações nos diplomas.  Paulo Estêvão defende ainda que o processo deve regressar à ‘estaca zero’, ou seja: reiniciar-se todo o processo legislativo com uma discussão pública que diz ter faltado neste diploma. Por fim, Aníbal Pires, do PCP, partido que aprovou o diploma juntamente com o PS, é  o único a concordar com a posição de repetir a votação “face ao clima de confusão que alguns partidos políticos com assento parlamentar têm fomentado na opinião pública” e para que “tudo fique esclarecido”.
Rui Jorge Cabral"
In Jornal Açoriano Oriental