quinta-feira, 28 de fevereiro de 2008

O Censor

Confesso que já andava admirado, tendo em conta os tiques totalitárias deste PS, versão 99,6%, que ainda não tivesse sido enviado um zelota do aparelho, munido da costumeira tesourinha da censura.

A missão foi confiada o autor do blog “Um Blog Tipo Assim,”. A minha primeira reacção foi analisar o perfil do autor do blog. Podia tratar-se de um tipo independente, não politicamente comprometido, merecendo, nesse sentido, uma análise séria.

No entanto, o perfil confirmou que se tratava, de facto, do aguardado “enviado rosa”. Deixo, aqui, um breve resumo do mesmo, para os nossos leitores: André Bradford; Ano do Zodíaco: Cão; Acerca de mim: Benfiquista e militante doente do PS (fiz uma pequena alteraçãozinha, de carácter estético, na medida em que considero que doentes só podem ser os que não são do Benfica).

Acresce, a este curto mas informativo perfil, que André Bradford é o actual representante do Governo Regional na Comissão Bilateral Permanente do Acordo das Lajes.

Dito isto, tendo em conta a absoluta nulidade desta Comissão e do ridículo papel que o nosso representante anda lá a fazer, penso que fica apresentado, com justiça, o personagem.

Então o que diz o André? Diz várias barbaridades e deselegâncias, mas vamos por partes. Diz que o Dr. Estêvão dá muitas conferências de imprensa que são “sobre tudo e sobre nada”.

Vamos aos factos. Desde o início do ano, o PPM-A teve cinco coberturas televisivas. Em alguns telejornais já somei 10 intervenções do PS, entre membros do Partido e do Governo Regional (em acções de pura propaganda, como são as recentes vistas estatutárias).

De que proporcionalidade é que o Dr. André fala? Sonha com mais uma banhada de 99,6%? Se é isso rendo-me à sua visão pluralista da democracia. Se calhar, o melhor é a oposição nem sequer se apresentar às eleições. Assim, evitávamos a maçada de um conjunto de insignificantes aborrecerem o serão televisivo do importantíssimo representante do Governo Regional na Comissão Bilateral Permanente do Acordo das Lajes.

Temos, depois, o conteúdo das intervenções do PPM-A. Falar da criação de uma disciplina de conteúdos regionais, quando a política educativa do PS provoca uma profunda ignorância da história dos Açores, não é importante? Denunciar que o PS quebrou a sua promessa eleitoral de instalar os cabos de fibra óptica, no Grupo Ocidental, é falar sobre nada? Denunciar a ruptura de stocks de produtos essenciais na ilha do Corvo, não é importante? Falar da exclusão da ilha do Corvo de um programa de turismo sénior, cujo conceito nuclear é a integração territorial, não tem relevância? Tudo isto sucede enquanto o deputado corvino do seu partido pouco mais faz, na Assembleia Regional, que tirar o pó e polir o tampo da cadeira da 24.ª fila.

Para o Dr. André Bradford, relevante é o facto de vir dizer na comunicação social que desconhece qualquer proposta americana relativamente à eventual criação de uma área de treino para aviões de caça, quando até as lavadeiras do Nepal já tinham conhecimento desse facto.

Eu, se fosse tratado com este desdém, já me teria, por uma questão de vergonha e honra, demitido, há muito, dessas funções. Não é o caso do Dr. André Bradford, facto que diz muito sobre o carreirismo político que o anima.

No final do texto, este zelota ideológico faz a mais inacreditável e vergonhosa proposta que vi fazer nos últimos anos. Segundo ele, a RTP-A deve ter como função “mitigar a produção noticiosa do Dr. Estêvão com critérios de interesse noticioso”. Quais são esses critérios? Os que impedem a crítica fundamentada ao Governo? Os que o Dr. André Bradford ou o Partido Socialista definirem?

Não se preocupe com o futuro, Dr. André, se o regime cair nos Açores, Havana, Caracas ou Pequim terão, sempre, um lugar especial para si. Lá poderá realizar o seu sonho de chegar a alto-comissário da censura política televisiva. Não dá muito trabalho a calcular a proporcionalidade: Governo 100%, oposição 0%. Um autêntico sonho. Não é Dr. André Bradford?

terça-feira, 26 de fevereiro de 2008

O Grumete Assustadiço

O que mais detesto na actividade política é a ambiguidade, o oportunismo táctico, a falta de compromisso e a traição. Diz Costa Neves que “o PSD-A não concorda completamente com as soluções encontradas para regular as remunerações dos parlamentares regionais previstas na proposta de alteração do Estatuto”. Então porque é que aprovou e subscreveu esta proposta na Assembleia Regional?

De certeza que o CDS/PP e o PS não concordavam, inteiramente, com outras soluções que o PSD apresentou no âmbito da Revisão do Estatuto. No entanto, não os vejo a dar este espectáculo miserável de, à primeira contrariedade na opinião pública, trair a confiança dos outros parceiros políticos num documento que contou com a unanimidade de todos.

Diz ainda Costa Neves que “o PSD-A entende que as soluções encontradas pecam, em termos de transparência, porque recorrem, em demasia, a determinadas soluções que não são perfeitamente transparentes”.

Pior a emenda que o soneto. Se acha isso, por que razão o PSD aprovou, na Assembleia Regional “normas pouco transparentes”?

Tudo isto cheira a puro oportunismo político. O líder do PSD só passou a achar que as normas eram pouco transparentes depois da comunicação social as ter diabolizado.

A partir daí, como um qualquer grumete assustadiço, ensaiou o mergulho para fora do navio. Dizem que os ratos são sempre os primeiros a fugir dos navios em risco de submergir. Na política, cada um sabe com quem se quer parecer.

Nesta questão ficou bem patente o que se pode esperar de Costa Neves quando alguém ou os próprios órgãos do Partido estiverem em dificuldades. No meio da tempestade não olhem para o comandante. Nem ele, nem sequer a sua sombra lá estarão.

Quanto à substância da questão, nem falo. Seria fácil cavalgar a onda de descrédito do sistema político e, em particular, do Parlamento. Tenho a minha própria opinião, mas recuso a rendição incondicional à lógica perversa do populismo mais básico e cobarde.

Imagino a vergonha que o Grupo Parlamentar do PSD estará a sentir neste momento. O líder do Partido desautorizou-os publicamente e acusou-os de se beneficiarem economicamente com normas pouco transparentes.

Sim, porque, que eu saiba, não tinham nenhuma pistola apontada à cabeça quando votaram um documento que contém normas pouco transparentes. Nem fizeram qualquer declaração de voto a denunciar a coacção a que foram submetidos pelos outros grupos e representações parlamentares.

Enfim, tenho a impressão que Costa Neves desistiu de ser um líder político respeitável e responsável. Prefere representar o hollywoodesco papel de Robin Hood dos tempos modernos. O único problema que vejo, neste seu novo tique vocacional, é o pormenorzinho de começar, a novel carreira, justamente no seu laranjal. Não deveria ser no roseiral?

Uma última reflexão, de carácter filosófico. Se ladrão que rouba ladrão tem cem anos de perdão, quantos anos de perdão merece Costa Neves?

Por mim, tiro-o já deste purgatório político e dou-lhe toda a eternidade nos jardins terrenos do éden. Não é uma caridade desinteressada, mas sim uma manigância ditada pelo desespero de o ver arrastar toda a oposição para o fundo do brejo.

A Questão Basca

O nacionalismo basco surgiu no final do século XIX, embora muitos queiram ver nas Guerras Carlistas – iniciadas na primeira metade desse século – uma primeira manifestação nacionalista basca contemporânea. No entanto, foi Sabino Arana, fundador do Partido Nacionalista Basco (1895), quem organizou, política e socialmente, o nacionalismo basco e lhe forneceu muitos dos seus elementos simbólicos.

A identidade nacional basca assenta numa língua e tradições ancestrais que a diferenciam, de facto, de todas as outras nações europeias de língua indo-europeia.

Durante a II República Espanhola (1931-1939) o País Basco obteve o seu primeiro Estatuto de Autonomia que, após a vitória de Franco na Guerra Civil (1936-1939), foi abolido.

A ETA foi fundada em 1959, no período áureo das guerras revolucionárias de libertação nacional, no contexto do regime franquista e da Guerra-Fria. O seu objectivo era alcançar a autodeterminação nacional do povo basco – no âmbito de um contexto territorial que integrava os sete territórios históricos, localizados no território dos Estados espanhol e francês – e a revolução social.

De acordo com os manuais revolucionários da época, a ETA iniciou uma sangrenta guerrilha urbana contra as forças da potência ocupante.

Entretanto, o contexto espanhol e internacional começou a mudar. A partir de 1978, após uma transição política bem realizada, foi aprovada uma nova Constituição Espanhola que reconhecia o povo basco como uma nacionalidade histórica do Estado Espanhol e criado um Estatuto Político para o País Basco (o Estatuto de Guernica) que lhe concedia elevados níveis de autonomia.

No final da década de 80, com o anunciado colapso da União Soviética (1991), termina a Guerra-Fria. As guerrilhas revolucionárias de esquerda perdem, assim, em termos ideológicos e políticos, uma parte importante do contexto internacional legitimador.

O objectivo final de todas as facções nacionalistas, ninguém duvide disso, é a independência política de toda a Euskal Herria (Euskadi, Navarra e o chamado País Basco francês).

Este objectivo final, de natureza irredentista em relação à Comunidade Foral de Navarra e às zonas bascas do Estado francês, tornam a questão basca ainda mais complexa, uma vez que uma hipotética independência política de Euskadi não resolverá, por si só, toda a questão político-territorial ligada ao nacionalismo basco.

Um País Basco independente será um foco de instabilidade permanente para os vizinhos Estados espanhol (Navarra e os enclaves de Villaverde de Trucios e de Trevinho) e francês (Lapurdi, Zuberoa e Nafarroa Behera).

Este último factor torna a “questão basca” numa espécie de Curdistão europeu e atrasará a sua resolução definitiva. Enquanto for possível, os Estados espanhol e francês adiarão a independência política de um Estado que possuirá, com total certeza, reivindicações territoriais sobre uma parte dos seus respectivos territórios.

A minha convicção pessoal é que a independência de Euskadi será inevitável, num futuro próximo. Os desafios que a mesma colocará à sobrevivência do próprio Estado espanhol são enormes e abalarão os alicerces do equilíbrio peninsular e da estabilidade da União Europeia.

segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

Xanana Gusmão e Ramos-Horta

Em política não existe gratidão ou reconhecimento. Mesmo os que logram chegar à categoria de pais das pátrias só conseguem manter esse reconhecimento em vida se, a partir de determinado momento, passarem a uma espécie de limbo ou estado vegetativo.

Recordem os casos de Winston Churchill ou de Charles de Gaulle. Ambos caíram em desgraça porque persistiram em manter-se politicamente activos depois de ter passado a conjuntura política em que prestaram relevantíssimos serviços aos seus respectivos países.

Vejam, também, o caso paradigmático de Sá Carneiro. Num curto período de tempo, o líder histórico do PPD/PSD enfrentou as maiores cisões partidárias da história desse partido. No entanto, hoje não existe sector do partido que não se reveja e produza abundante hagiografia sobre ele. A principal razão deste facto é que está morto.

Ao contrário, Mário Soares, ousou durar demasiado tempo. Por isso, o povo e o aparelho partidário decidiram despachá-lo, para a berma do sistema, com 17%. Eu acho que, só pelo momento da sua vida, o discurso da Fonte Luminosa, o homem merecia, para sempre, pelo menos 50%.

Aliás, devo confessar que votei nele, nas últimas eleições presidenciais, só para ficar bem com a história. Dentro de, não muito tempo – é a lei da vida – não faltarão hossanas ao velho político desaparecido. A primeira fila estará compacta com os velhos camaradas que nunca o abandonaram. O homem recuperará a unanimidade socialista e até pode vir a surgir um bom poema póstumo.

Xanana Gusmão e Ramos-Horta, os heróis da independência timorense, são mais dois casos que terminarão em tragédia se, pura simplesmente, continuarem vivos ou persistirem em manter-se na primeira linha da política timorense.

O panteão das lendas clama por eles. O povo não gosta de ver heróis de carne e osso. Parecem-se demasiado com os … humanos.

Foi por isso que os gregos inventaram, a par da democracia, o Olimpo. É esse o lugar dos mitos. Longe da vista e perto do coração. Uma vez distantes, invisíveis, misteriosos e herméticos, estes poderão vir a tornar-se, novamente, úteis.

Todos ficarão felizes. Os liliputianos do costume tomarão conta das minudências do quotidiano pós-épico e depois surgirão – é fatal como o destino – as inevitáveis pitonisas do regime.

As criaturas, a que aludo anteriormente, viverão da sempre lucrativa, mas duvidosa, ciência da adivinhação política da vontade dos totens da pátria (o Xanana teria feito assim, o Ramos-Horta pensava isto, etc.).

Digam lá! Isto não é melhor do que andar, a torto e a direito, a levar tiros? Por uma vez, dêem-me ouvidos. De vez quando, também acerto um prognóstico antes do final do jogo.

domingo, 24 de fevereiro de 2008

Monarquia Versus República

O debate entre a monárquicos e republicanos continua em Portugal, passados que estão 98 anos do Golpe Militar que proclamou a República, completamente inquinado.

O regime político de 1910 era, na época, uma das democracias parlamentares mais avançadas – no campo da liberdade política e da garantia dos direitos e liberdades dos indivíduos – da Europa. O Partido Republicano estava representado no Parlamento e a liberdade de imprensa era um facto, apesar da extrema virulência do estilo político adoptado pela minoria republicana.

Na minha perspectiva é incompreensível que o actual regime democrático continue a festejar um golpe de Estado contra um regime democrático, de base parlamentar.

O regime republicano que lhe sucedeu não foi, sob muitos aspectos, uma democracia. Existia uma espécie de direito de tendência no campo republicano, mas os partidos monárquicos estiveram, durante muito tempo, proibidos. A base censitária do regime político diminuiu 75%, uma vez que os republicanos diminuíram drasticamente o número de cidadãos com direito de voto.

A base jurídica do Estado, nomeadamente no âmbito da independência do poder judicial e do respeito pelas liberdades e garantias individuais, foi duramente afectada através das ingerências de um poder político que ostentava a “legitimidade revolucionária”.

Esta é a verdade factual dos factos que, passados quase cem anos sobre estes eventos, o regime republicano continua a escamotear.

Actualmente a Constituição Republicana é das poucas no Mundo que impedem uma evolução democrática para um regime monárquico. A natureza republicana do Estado é irrevogável, por decreto. Numa verdadeira democracia não deveria ser a população a optar livremente pela forma de regime? Não constitui este facto uma limitação à liberdade de escolha dos portugueses? Não constituirá esse facto a derradeira herança política da I República: a legitimidade revolucionária e a natureza irrevogável da forma republicana do Estado?

Estabelecidas as bases históricas deste debate em Portugal, vamos aos argumentos:

1) A monarquia representa em Portugal a continuidade do projecto nacional que liga o nascimento do país com a geração actual. Nestes quase novecentos anos de projecto colectivo, um dos mais brilhantes e profícuos da história mundial, a República representa um corte epistemológico com o passado. A república criou novos símbolos nacionais (a bandeira e o hino), mas a alma colectiva do país continua a rever-se no Azul do Mar e na grandeza do brilhante percurso histórico da monarquia portuguesa;

2) A monarquia representa em Portugal a força moderadora do poder do Estado e das suas elites. A singularidade política do Estado português e do seu percurso histórico resultou da secular aliança entre a Coroa e os Concelhos. Esta particular natureza do nosso Estado monárquico deu à Coroa um carácter popular, único na história mundial. O Rei português nunca foi o representante das elites. Ele representou, pelo contrário, o último obstáculo ao domínio absoluto e autocrático das elites portuguesas. Nesse sentido, a monarquia portuguesa possui um enorme potencial de apoio popular. A história legitimará o seu papel no futuro.

3) A monarquia representa a independência e a equidistância do Chefe de Estado. A descrição constitucional do Presidente da República como símbolo da unidade da Nação e da neutralidade no exercício do poder é uma ficção. Na prática os Presidentes da República são chefes de facção e representam pouco mais que os cerca de 50% dos eleitores que votaram neles. Representam tendências ideológicas e partidárias que transportam para a Chefia do Estado. Neste aspecto é interessante notar que os quatro Presidentes constitucionais foram presidentes de partidos políticos. Na prática representam um árbitro escolhido por uma das equipas em jogo. O papel que desempenham é assim exactamente o contrário do que lhes está consignado constitucionalmente: representam um factor de instabilidade política no âmbito da coabitação institucional ou de paternalismo político e beneplácito se partilham a mesma origem partidária do Governo. O Rei, devido ao seu papel de representante directo do projecto nacional e à sua real independência política, está realmente habilitado a desempenhar esse papel;

4) A monarquia enquanto garante de modernidade social e do progresso económico. Alguns dos países social e economicamente mais avançados do Mundo são monarquias constitucionais democráticas (Reino Unido, Canadá, Nova Zelândia, Austrália, Japão, Holanda, Bélgica, Suécia, Noruega, Dinamarca, Luxemburgo, Espanha, etc.). A estabilidade política que propiciam, a congregação do esforço nacional que motivam e a adaptação social que permitem, a partir da solidez do projecto nacional, são factores que demonstram que monarquia e modernidade são dois conceitos convergentes;

5) A monarquia enquanto garante da independência nacional e instituição sobrevivente ao federalismo europeu. No debate europeu sobre a integração federal, o facto de se possuir uma instituição monárquica é uma vantagem no que diz respeito à sobrevivência constitucional dos particularismos nacionais. O Rei representa a sobrevivência do projecto nacional para além da grande república federal europeia. Representa um elemento diferenciador e não absorvível na futura ordem constitucional europeia. Ele representará a referência histórica e simbólica da independência dos Estados monárquicos e a garantia da sua continuidade (pelo carácter não absorvível da instituição monárquica). Pelo contrário, as particularidades constitucionais e nacionais das repúblicas resistirão, com muito maior dificuldade, à força integradora e uniformizadora do futuro Estado Federal Europeu. Neste contexto, o projecto nacional pode vir a confundir-se com simples localismo;

6) A monarquia enquanto factor de projecção internacional. Devido aos seus particulares vínculos com países e regiões que integraram, em algum momento da sua história, o território da Coroa Portuguesa, a monarquia está em condições dar a Portugal uma especial projecção externa no Mundo onde a nossa presença histórica foi um facto (que ultrapassa em muito os países de língua oficial portuguesa). É isso que faz o Reino Unido no seu antigo espaço imperial ou a Espanha, na América Latina.

7) A monarquia enquanto garante da tradição municipalista e factor da unidade nacional. A ligação histórica entre a monarquia e os municípios é um factor matricial da história de Portugal. Representa uma tradição de desenvolvimento de um país equilibrado em toda a dimensão do seu território. Representa também a sobrevivência de um país plural, extremamente rico na multiplicidade das suas tradições locais. A monarquia pode fazer essa síntese num momento em que o interior se despovoa e perde a sua tradição ruralista. Por outro lado, essa experiência e legitimidade histórica na observância da autonomia local representam um factor importante enquanto referencial colectivo da unidade da Nação Portuguesa, acima de todos os localismos e interesses especificamente regionais (isto quando se fala, novamente, na regionalização do país);

8) A monarquia enquanto fonte de poupança nacional. Sabe-se hoje que o actual regime republicano fica extremamente caro ao país. O actual Presidente da República e os seus três antecessores (que possuem serviços e pessoal afectos) custam ao país mais 40% que o total das despesas que a Espanha paga para manter a totalidade da sua Casa Real. Este simples facto demonstra que o argumento económico utilizado contra as monarquias constitui uma autêntica falácia.

sexta-feira, 22 de fevereiro de 2008

Nunca é tarde para discriminar e excluir a ilha do Corvo

O PPM fez hoje aprovar uma moção, na Assembleia Municipal, em que se solicita ao Governo Regional que integre a Ilha do Corvo no Programa de Turismo Sénior 60+ “Nunca é Tarde para Descobrir os Açores”.

A exclusão, da ilha do Corvo, deste programa é o acto mais aberrante e injusto com que já fui confrontado na minha vida política. Como é possível pensar um programa vocacionado para combater a exclusão territorial e deixar de fora, precisamente, a ilha mais excluída?

Faltam ligações aéreas ou lugares no avião? Segundo o Governo não, uma vez que os aviões do Corvo viajam – dizem eles – às moscas (por isso, defende o Governo Regional, não são necessários mais voos).

Não existem camas? É mentira! Temos uma residencial de grande qualidade, cuja capacidade está longe de ser totalmente utilizada na época baixa. Além disso, temos várias ofertas de quartos por toda a Vila.

Não existe interesse por parte dos açorianos em conhecer a ilha do Corvo? Estou em crer que o que se passa é exactamente o contrário, na medida em que a ilha do Corvo é o destino mais desconhecido dos açorianos, justamente devido à exclusão territorial de que é alvo. Assim, a vontade de conhecer a ilha do Corvo é, seguramente, muito grande para uma parte apreciável dos açorianos.

O Governo Regional acha que a ilha não tem vocação para a área turística? Também não é verdade, uma vez que os planos do Governo Regional contemplam a criação de oito dezenas de camas até 2015. Não se percebe é como é que pretende alcançar esse resultado discriminando a ilha no âmbito de projectos que incrementam os fluxos turísticos internos.

Enfim, não existe nenhuma razão válida para excluir a ilha do Corvo deste programa. O que se está a passar, neste âmbito, é uma vergonha para o Governo Regional da Região Autónoma dos Açores.

Duas palavras finais para a atitude do PS na Assembleia Municipal do Corvo, no âmbito da discussão deste assunto. Cobarde e mesquinha.

quinta-feira, 21 de fevereiro de 2008

A Desagregação do Estado Espanhol

O Estado espanhol – na sua configuração territorial actual – resulta do casamento, no século XV, dos herdeiros dos tronos de Castela e de Aragão. Mais tarde, estes mesmos príncipes – os Reis Católicos (Fernando e Isabel) – conquistaram os reinos de Granada (1492) e Navarra (1512).

A união dinástica, que vigorou a partir desse período, não alterou, sob o ponto de vista jurídico, o estatuto específico dos diversos reinos que passaram a integrar a nova monarquia, uma vez que os mesmos mantiveram órgãos de governo próprio e sistemas fiscais específicos.

O processo centralista, exercido a partir de Castela, tornou-se mais visível a partir do século XVII devido às obrigações imperiais da dinastia reinante, os Habsburgos. Depois da exaustão fiscal de Castela, a única solução era o ataque aos privilégios fiscais dos reinos periféricos da Península.

O resultado destas políticas foi a revolta generalizada dos povos peninsulares periféricos – foi neste contexto que Portugal pôs fim à sua própria ligação, de 60 anos, com esta dinastia – e o fim da Espanha como grande potência europeia.

A ascensão dos Bourbons (século XVIII) e a acção subsequente dos Governos Liberais do século XIX, acentuaram as políticas centralistas que se consubstanciaram na perseguição às línguas e ao que restava da organização institucional destes povos.

Tirando o breve interregno da II República espanhola, só com a Constituição de 1978 é que voltaram a ser reconhecidas as especificidades das nacionalidades históricas do Estado (catalã, basca e galega). Como se sabe as outras Comunidades Autónomas resultaram da fórmula redundante de Adolfo Suárez, o célebre “ café para todos “.

A partir daí o processo histórico acelerou-se vertiginosamente. Na Europa de Leste, após a derrocada do comunismo, os nacionalismos ressurgiram e desintegraram os grandes estados plurinacionais (URSS, Checoslováquia e Jugoslávia).

Em Espanha os partidos nacionalistas tornaram-se, por força do seu crescimento eleitoral, incontornáveis nos Parlamentos e nos Governos das Comunidades Autónomas (Catalunha, Euskadi e Galiza). Exigem actualmente novos Estatutos de Autonomia que superam o marco constitucional vigente, nomeadamente no que diz respeito ao pretendido reconhecimento do seu estatuto de nações e à faculdade de exercer, no futuro, o direito à autodeterminação.

A estratégia do Governo central foi, durante o consulado de Aznar, tentar conter o dique nacionalista através da confrontação política permanente e da utilização dos recursos institucionais do Estado. Esta estratégia provocou a radicalização política dos sectores nacionalistas e estava funcionalmente esgotada.

O novo Governo socialista aplica uma estratégia diferente. Aposta tudo numa estratégia de apaziguamento com as forças nacionalistas. Promete uma segunda “Transição” que se consubstanciará, na prática, na edificação de um Estado espanhol de natureza confederal. De forma instrumental, o Partido Socialista passou a integrar – na Catalunha, Galiza e no Estado – coligações com os partidos nacionalistas de esquerda tentando sobrepor, em vão, o factor ideológico ao nacionalismo.

Esta conjuntura tem muitos pontos de contacto com a estratégia tentada pelas democracias ocidentais, na década de 30 do século passado, em relação à Alemanha Nazi. Líderes fracos, governando países com opiniões públicas incapazes de aceitar os sacrifícios inerentes a estratégias de confrontação, tentaram apaziguar um adversário muito mais determinado e predisposto a correr mais riscos.

A estratégia de Zapatero apenas adiará o inevitável. Para o Governo socialista os novos Estatutos – que criarão entidades de carácter nacional quase independentes – será o esticar da corda definitivo. Para os nacionalistas esta será apenas a penúltima etapa rumo à independência.

O Estado e a sociedade espanhola estão prestes a atravessar o último Rubicão psicológico. Ao reconhecerem o carácter nacional de povos como o basco, o catalão e o galego, tornam irreversível o reconhecimento – a prazo – do direito implícito a esse estatuto: a autodeterminação.

A esta análise do processo político espanhol juntamos a convicção que estas nações – que possuem uma forte consciência nacional e uma língua e cultura próprias – têm, de facto, o direito à autodeterminação.

Defender o contrário seria renegar o nosso próprio processo histórico. A diferença está apenas no carácter vitorioso da nossa sublevação de 1640, em contraponto com o menor sucesso das inúmeras revoltas destas nações contra o poder espanhol.

A Península Ibérica está à beira da maior alteração geopolítica desde os Reis Católicos. Não me parece que a diplomacia portuguesa se esteja a preparar para esse cenário.

terça-feira, 19 de fevereiro de 2008

O Programa de Turismo Sénior "60+" e a Ilha do Corvo

O Governo Regional, através de protocolo entre as Secretarias Regionais da Economia e dos Assuntos Sociais e o Instituto Nacional para Aproveitamento dos Tempos Livres (INATEL), criou o Programa de Turismo 60+ “Nunca é Tarde para Descobrir os Açores”.

Trata-se de um programa de turismo sénior, especificamente dirigido a pessoas, com mais de sessenta anos, residentes nos Açores. O Programa, que contempla 1000 viagens a realizar entre 1 de Setembro e 31 de Maio, possui, de facto, condições de oferta/custo excepcionais. Por apenas 25 Euros, os utentes deste programa usufruirão de um pacote que inclui viagens, transferes, alojamento, animação cultural e visitas a museus e locais de interesse turístico (pelo espaço de uma semana).

Trata-se, sem dúvida, de uma boa iniciativa que terá, certamente, uma grande adesão. A questão que o PPM-A levanta é a exclusão da ilha do Corvo da lista de destinos potenciais.

Os responsáveis políticos locais – entre os quais nos incluímos como grande força autárquica local – possuem, como um dos seus principais eixos de acção política, o combate à ostracização da ilha do Corvo enquanto destino turístico.

As péssimas acessibilidades que possuímos – apenas três ligações semanais numa aeronave de pequena capacidade e a ausência de ligações marítimas de passageiros – colocam-nos numa situação de grande desigualdade no cenário regional.

Neste sentido, a exclusão da ilha do Corvo deste programa é um acto discriminatório completamente incompreensível. Ainda mais, quando se sabe que os conceitos associados a este programa são: a inclusão territorial, a acessibilidade e a não discriminação.

Este programa é a antítese de tudo o que pretende ser. Exclui, discrimina e em nada contribui para melhorar a acessibilidade. Visto da ilha do Corvo, o melhor nome para este programa é “Nunca é tarde para continuar a discriminar a ilha do Corvo”.

O Governo Regional coloca-nos, assim, numa posição completamente insustentável. Não aumenta o número de voos para a ilha porque diz que não temos tráfego que o justifique e não nos deixa aumentar o número de passageiros potenciais para não ter de aumentar o número de voos.

O PPM-A não compreende e não aceita esta discriminação que prejudica gravemente a ilha do Corvo ao negar-lhe todo o conjunto de receitas – refeições, dormidas, artesanato e todo o conjunto de serviços e produtos que os turistas adquirem ao longo de uma semana de estadia – que o programa irá, certamente, proporcionar às ilhas que dele beneficiam.

Do ponto de vista prático, vamos tomar as seguintes medidas:

1) Agendar este assunto para a próxima reunião da Assembleia Municipal do Corvo, de forma a propor o fim desta discriminação;

2) Exigir, ao Governo Regional, a alteração imediata do protocolo do programa para que o mesmo passe a incluir a ilha do Corvo;

3) Estudar todas as possibilidades de combater esta discriminação, agendando, para o efeito, reuniões com todas as instituições e serviços da ilha, de forma a coordenar as melhores formas de luta.

segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Mais e Menos Socialistas

Sou obrigado, por culpa das declarações do próprio, a voltar a comentar a eleição de Carlos César. Não é perseguição, mas é que o ridículo é tão grande que, pura e simplesmente, não resisto. Bom, o melhor mesmo é deixar o próprio Carlos César falar da sua épica vitória eleitoral.

“Represento, reforçadamente, a partir desta eleição, todo o PS na sua componente mais plural, aqueles que são menos socialistas e aqueles que são mais socialistas.” Confesso que eu, do alto da minha ignorância, pensava que os militantes socialistas eram todos … socialistas. Parece, no entanto, que existe uma diferença subtil entre os militantes socialistas: os mais e os menos socialistas.

Intriga-me esta diferenciação. Como se distingue um militante do PS mais socialista de um militante menos socialista? É importante que Carlos César venha, publicamente, esclarecer este conceito de militância. Creio que pode vir a fazer escola na política regional. Podemos vir a ter os militantes do PSD mais e menos social-democratas, os militantes do PCP mais e menos comunistas e por aí fora, num sem número de combinações.

Penso que é a isto que Carlos César – depois de ganhar, como candidato único, as eleições com 99,6% dos votos – se referia quando falava do “pluralismo político” do PS.

Enfim, não quero ser acusado de me fazer difícil e de me recusar a aprender novos conceitos. Nesse sentido, a minha proposta de resolução para esta charada, dos mais e menos socialistas, é a seguinte: os mais socialistas são os 2122 que votaram a favor, os oito que votaram contra são os menos socialistas. Quente ou frio?

Imagino que o inebriante ambiente desta vitória eleitoral deve ter, de alguma forma, contagiado um jornalista. Ou isso, ou então um bocadinho de champanhe a mais, porque não consigo compreender que género de pacóvio se lembra de perguntar, a um político que ganhou com 99,6% dos votos, se está incomodado com os votos contra recebidos.

Está bom de ver que, na sede do PS, a noite foi de loucura total, como forma de libertar o stress acumulado pela incerteza que acompanhou a noite eleitoral.

As declarações surpreendentes não se ficaram por aqui. O mais socialista dos socialistas açorianos, rejeitou que a abstenção de 43% significasse que o partido estivesse menos mobilizado. O facto é que, explicou César, a circunstância de existir apenas um candidato “fez com que as eleições não se tornassem urgentes para alguns militantes”.

De facto, alguma da malta mais pachorrenta do PS pode não ter percebido que é urgente votar antes das urnas fecharem. Enfim, pode ser que apareçam lá para Outubro.

domingo, 17 de fevereiro de 2008

Estatuto (I) - O Preâmbulo do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores

Propus, na Comissão Eventual para a Revisão do Estatuto Político-Administrativo da Região Autónoma dos Açores, em reunião realizada em 2006, que fosse elaborado um preâmbulo ao articulado do Estatuto.

Defendi que “nesta redacção, entre outros conteúdos, se descreva a evolução histórica do sentimento autonómico açoriano, assinalando marcos históricos. Que se utilize a expressão Povo Açoriano como referencial e que se acentue o carácter dinâmico e sempre inacabado da autonomia açoriana."

Considero uma vitória ideológica do PPM-A, que a Comissão tenha elaborado esse preâmbulo, respeitando parte dos vectores estruturantes que tínhamos proposto.

No entanto, considero que a redacção encontrada – sendo um avanço em relação à situação anterior – não é suficientemente descritiva em relação à luta dos açorianos pelo autogoverno, não acentua o carácter épico dessa afirmação colectiva e não sublinha, de forma suficiente, a identidade cultural, histórica e política diferenciada dos Açores.

O Estatuto consagra o “adquirido autonómico”, mas a concepção do PPM-A é mais avançada. Para nós, a construção dos mecanismos de autogoverno do Povo Açoriano é um processo dinâmico e sempre inacabado.

sábado, 16 de fevereiro de 2008

O Humor British da Malta do Site do PS

Títulos do Site do PS/Açores, no dia 16 de Fevereiro de 2008 (às 22h30):

• Carlos César reeleito Presidente do Partido Socialista dos Açores com 99,6% dos votos

• O PS é um partido plural

A Votação Albanesa de Carlos César

Carlos César ganhou as directas do PS com 99,6% dos votos.

Confesso que só agora começo a compreender as razões que levaram Carlos César a não querer estar mais de 16 anos no poder.

É claro que Carlos César disse antes que só seria novamente candidato em circunstâncias muito especiais e – antes disso – também disse que mais de oito anos de exercício de poder não é muito bom para a democracia.

Assim, à primeira vista, pode parecer que Carlos César mentiu, mas, se observarmos com mais atenção, podemos compreender que esta atitude revela apenas um comovedor desprendimento e um sentido do dever muito aguçado.

A verdade é que Carlos César, com esta votação, acaba de demonstrar que não precisa, de facto, de mais tempo. Bastaram-lhe 12 “diminutos” anos de poder para bater, aos pontos, as grandes figuras internacionais de referência da esquerda.

Ainda há uns dias, a comunicação social noticiava a eleição de Fidel Castro, da seguinte forma: “ Fidel Alejandro Castro Ruz foi reeleito deputado da Assembleia Nacional pelo seu distrito, próximo a Santiago de Cuba. Obteve 98,3% dos votos válidos. Era o único candidato do Partido Comunista de Cuba.”

Ou seja, o nosso grande líder deu, literalmente, uma autêntica banhada ao Fidel Castro.

Rompeu a sempre difícil barreira psicológica dos 99% de votos e demonstrou ao Fidel que não é preciso ficar no poder até à senilidade para conquistar o pleno afecto dos camaradas do partido (sim porque às oito alminhas que não votaram sim deve ter-lhes acontecido a mesma coisa que ao Monteiro: a caneta recusou-se a escrever … é uma situação que sucede com muito mais frequência do que se possa pensar).

Contudo, sem querer diminuir o mérito de César – respeito o velho aforismo bíblico: a César o que é de César – acho que este resultado totalmente imprevisível tem qualquer coisa de milagroso.

Não consigo deixar de pensar que a recente conversão de Carlos César ao milagre dos pastorinhos teve algo a ver com o que sucedeu. Isto, no fundo, é tudo uma questão de fé.

Eu acredito que o Carlos César acredita que chegou a hora de fazer os outros acreditar que ele também acredita. Complicado? Então tomem lá uma chapelada de 99,6% para simplificar.

sexta-feira, 15 de fevereiro de 2008

Transportes na Ilha do Corvo

O transporte marítimo do Corvo está totalmente dependente das Flores. Esta última ilha assume, nesse aspecto, a natureza de entreposto comercial obrigatório devido ao facto da reduzida dimensão da barra do cais do Porto da Casa não permitir a atracagem de navios de maior tonelagem.

Devido a esta limitação, a solução actualmente adoptada passa pela contratação dos serviços da empresa “Mareocidental” que, em tese, deveria assegurar o transporte de mercadorias entre as ilhas das Flores e do Corvo.

Sucede que este serviço não é realizado com a regularidade e a qualidade contratualizada, facto que prejudica todos os utentes da ilha e desestrutura gravemente a economia local.

No Inverno, a rupturas de stock de produtos essenciais e de combustíveis são frequentes.

O PPM-A não faz acusações infundadas. Vamos apresentar factos.

O contrato entre o Governo Regional e a Mareocidental, publicado na Resolução n.º 86/2000, de 4 de Maio, estabelece, na alínea b) da Cláusula 4.ª, a obrigatoriedade da embarcação efectuar um mínimo de 2 viagens semanais de ida e volta entre o Corvo e as Flores.

A penalização para este incumprimento é de 5 000 Euros, por semana. Desde Janeiro, até hoje, a Mareocidental realizou apenas 7 viagens (dias 7,11 e 21 de Janeiro e 1,7,8 e 13 de Fevereiro). Ou seja, a Mareocidental concretizou apenas 50% das viagens mínimas contratualizadas.

Ainda há menos de duas semanas, a ilha do Corvo esteve 11 dias sem ligações marítimas – facto que provocou a ruptura dos stocks de leite, iogurtes, fruta, arroz, etc. – sendo que, em apenas metade desses dias, o estado do mar impossibilitava, de facto, a travessia do canal.

É uma situação verdadeiramente escandalosa, que mostra bem a incompetência e negligência do Secretário Regional da Economia

Hoje, quando se recordam as triunfais declarações do Dr. Duarte Ponte, proferidas aquando do baptismo do Santa Iria, não podemos deixar de sorrir com as atordoadas então proferidas por este: ”este barco vai terminar com as cíclicas rupturas de abastecimento devido ao mau tempo, uma vez que está preparada para enfrentar a ondulação de seis metros”. Piores previsões do Zodíaco só mesmo as do célebre Zandinga.

Ainda pior que isto, são as inacreditáveis e completamente irresponsáveis declarações do Secretário da Economia, em 2006. Confrontado com o incumprimento da Mareocidental, Duarte Ponte limitou-se a reconhecer que “existem razões para quebrar o contrato com a Mareocidental, mas que não existem outras alternativas.”

Ora isto é inadmissível porque o Governo tem de garantir, sempre, a criação de alternativas para assegurar a eficácia e a qualidade das ligações comerciais em todas as ilhas da nossa Região. Esse é um dever institucional ao qual não pode eximir-se.

Mais, estas afirmações transmitiram à empresa “Mareocidental” uma mensagem muito perigosa porque permitiu, ao armador em causa, inferir a certeza de uma total impunidade, cumpra ou não as suas obrigações contratuais.

É nesta situação em que estamos. Votados ao mais completo abandono por um Secretário Regional sem vontade, nem capacidade de resolver o problema do abastecimento da ilha do Corvo.

A poucos meses do final da legislatura, que se pode esperar, neste assunto, deste Governo Regional? Não muito. Resta-nos a arma da denúncia pública desta situação e esperar que a opinião pública açoriana não aceite que a sua mais desprotegida ilha continue a ser exposta a rupturas de abastecimento, verdadeiramente terceiro-mundistas.

No que se refere às ligações aéreas, a situação da ilha é igualmente dramática. Somos servidos por uma aeronave velha, submetida a reparações constantes, com uma limitadíssima lotação de passageiros e uma ainda mais residual capacidade de carga.

Temos direito a três ligações semanais ao longo de todo o ano – quando as outras ilhas já beneficiam de ligações diárias, durante grande parte do ano – sendo que, na prática, cerca de 30% das mesmas nem sequer se realizam.

Nesta área, tal como nos transportes marítimos, restam-nos as armas da denúncia e da solidariedade dos outros açorianos.

quinta-feira, 14 de fevereiro de 2008

Territórios Autónomos com Domínio de Primeiro Nível


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Expansão dos Cabos de Fibra Óptica ao Grupo Ocidental

As novas tecnologias, nomeadamente no âmbito da capacidade e qualidade de transmissão da informação, são cruciais para que a Região possa ganhar a batalha do desenvolvimento e da modernização.

Nesta área, um dos maiores erros e injustiças cometidas pelo actual Governo Regional foi a não instalação do sistema de cabos de fibra óptica em toda a Região, logo que definiu e começou a montar a respectiva rede.

Ficaram de fora as ilhas do Grupo Ocidental, alegadamente porque se poderia substituir, com vantagem, esta tecnologia pelo mais barato sistema de propagação da informação via satélite.

A baixíssima qualidade actual das comunicações nas ilhas do Corvo e das Flores – a pior da Região – demonstrou aquilo de que os técnicos nunca tiveram dúvidas: o Grupo Ocidental ficou fora do sistema de fibras ópticas regional por mera opção económica e política. Com menos influência e poder de reivindicação no sistema político regional, estas ilhas foram preteridas por motivos meramente economicistas.

Na verdade, as vantagens relativas do sistema de fibras ópticas são incontestáveis: banda passante com um potencial muito grande; imunidade a interferências e ruído; grande segurança da informação e do sistema.

O Governo Regional e o Partido Socialista reconheceram, em 2004, que a exclusão das ilhas das Flores e do Corvo do sistema de fibras ópticas significava, a curto prazo, o colapso do sistema montado nestas ilhas.

Nesse sentido, o partido Socialista introduziu, no programa eleitoral para as eleições regionais de 2004, a promessa de expansão do sistema de cabos de fibra óptica às ilhas do Corvo e das Flores. Não cumpriram.

Nesta conjuntura, exige-se que o Governo Regional garanta, até ao fim do actual mandato, a efectiva expansão dos cabos de fibra óptica ao Grupo Ocidental. Não aceitaremos menos que isso.

quarta-feira, 13 de fevereiro de 2008

Um Domínio de Primeiro Nível para os Açores (zi)

A modernização das sociedades actuais, do ponto de vista económico e social, depende, entre outras coisas, de uma rápida adaptação às novas tecnologias informáticas, nomeadamente à internet.

Sendo este meio um espaço global por excelência, cada vez mais complexo e saturado de informação, possui uma importância vital, para as nossas empresas, instituições e serviços (para efeitos de defesa da marca e identidade comercial, cultural e política), a possibilidade de identificação, das respectivas páginas, à RAA, através do uso de um domínio de primeiro nível na internet.

A normativa de concessão destes domínios é da responsabilidade da Internet Corporation for Assigned Names and Numbers (ICANN). A lista ISO3166 contém todos os domínios reconhecidos e nela podemos encontrar sobretudo países independentes, embora existam muitos territórios autónomos, sobretudo Arquipélagos, que conseguiram a sua inscrição.

Tendo em conta a importância estratégia desta medida e a mais valia que ela terá para os Açores, a nossa proposta é que seja criado, com celeridade, um domínio próprio para a nossa Região. Uma vez que az já foi atribuído ao Azerbeijão, propomos o domínio zi (Azores Islands).

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2008

Polícia Regional dos Açores

Defendi, em nome do PPM-A, no âmbito da audição realizada junto da Comissão Eventual para a Revisão do Estatuto Político-Administrativo da RAA, realizada no dia 12 de Junho de 2006, a criação da Polícia Regional dos Açores.

Disse, nessa altura, o seguinte:

“Defendemos que deve ser contemplada estatutariamente a criação de uma polícia regional sob a directa responsabilidade do Governo Regional.

Temos constatado, nos últimos anos da vida política regional, que a população atribui ao Governo Regional responsabilidades nesta área e que o Governo não tem, actualmente, mecanismos para poder, de facto, implementar políticas mais eficazes e mecanismos directos para reforçar a segurança pública e enfrentar aquilo que já se apresenta com alguma degradação nesta área.

Nesse sentido, defendemos que a solução passa pela criação de uma polícia regional. Isto não inviabilizaria que continuassem a existir as polícias nacionais e que o financiamento fosse assegurado no âmbito de um modelo semelhante ao que se está a desenhar para as Canárias. “

Tínhamos, infelizmente, razão. A insegurança da população açoriana continuou a agravar-se neste ano e meio. Os sucessivos Relatórios Anuais de Segurança Interna comprovam que o sentimento de insegurança está realmente associado a um significativo aumento da criminalidade. Em 2006 registaram-se 10493 crimes participados, facto que nos transformou na quarta região do país com mais crimes por mil habitantes.

Os factores ligados à expansão da criminalidade – toxicodependência, alcoolismo, desemprego, crescente degradação do nível de vida dos extractos socio-económicos mais desfavorecidos, erosão das referências éticas tradicionais e a expansão da sensação de impunidade dos criminosos – não pararam de incrementar-se neste período.


Por outro lado, confirmou-se que o dispositivo de coordenação operacional e tutela política continha graves deficiências nos Açores. Quer o Governo Regional, quer o Representante da República não possuem qualquer competência real na área da coordenação ou supervisão sobre as polícias.

Nestas condições, resta apenas o Ministério da Administração Interna do Estado, localizado a mais de 2000 quilómetros de distância. Na lista de preocupações deste organismo, o aumento da criminalidade nos Açores deve representar pouco mais que uma nota de rodapé. Um mero fait divers comparado com as preocupações geradas pelas noites violentas da Invicta.

Os protestos crescentes de uma população farta de ser violentada despertaram, finalmente, a atenção da classe política regional. O Governo Regional quer coordenar as forças policiais destacadas no território da Região, o CDS/PP defende a criação de polícias municipais e o PSD prepara uma bateria de diplomas que criarão um sem número de órgãos consultivos e de coordenação.

Ora tudo isto é profundamente ineficaz, na medida em que não se criam verdadeiras forças policiais de combate à criminalidade (é o caso da proposta do CDS/PP) ou porque apenas se geram mais órgãos de carácter meramente burocrático, sem qualquer capacidade operativa real (é o caso das propostas do PS e do PSD).

Nas circunstâncias actuais, que tenderão a agravar-se, o Governo Regional necessita de poder tutelar, de forma integral e directa, uma força policial eficaz, à semelhança do que as Canárias vão passar a fazer.

A eficácia de qualquer tutela policial real depende do controlo integral de factores como: a autonomia na definição do modelo policial, a capacidade de planificação geral, a definição do modelo de gestão, o exercício do comando efectivo, a planificação da distribuição do contingente policial, a capacidade de exercer um verdadeiro controlo de execução e a prerrogativa de definir a dimensão do contingente e a sua variabilidade.

Na nossa opinião, só a criação de uma força policial própria dará ao Governo Regional o pleno controlo desse género de factores.

É nesta perspectiva que o PPM/Açores decidiu efectuar um último esforço para tentar integrar na Proposta de Revisão do Estatuto Político-Administrativo, actualmente em discussão na Assembleia da República, a possibilidade estatutária da Região poder vir a criar uma Polícia Regional.

Nesse sentido, o Presidente Nacional do Partido, o Deputado Nuno da Câmara Pereira, fará uma intervenção no Plenário da Assembleia da República, no dia 31 de Janeiro, em que apelará a um consenso político alargado sobre esta questão.

A partir daí, vamos continuar a efectuar o esforço político necessário para integrar no Estatuto essa possibilidade, mesmo que essa referência fique condicionada, do ponto de vista da concretização prática, a uma possível alteração constitucional a realizar em 2009.

domingo, 10 de fevereiro de 2008

Visitas Estatutárias

Não é saudável, para a nossa democracia, que os dirigentes do Partido Socialista, que exercem funções no Governo Regional, participem, no mesmo dia e no mesmo local, em acções de carácter governativo e partidário.

Esta situação está a ocorrer, de forma sistemática, no âmbito das visitas estatutárias que o Governo Regional se encontra a realizar. Nomeadamente, referimo-nos aos comícios políticos que o Partido Socialista está a realizar no âmbito das visitas estatutárias governamentais.

Não é aceitável que o Partido Socialista aproveite os dinheiros e os meios públicos que estão ao dispor dos membros do Governo Regional – para assegurar e custear a respectiva deslocação, estadia e demais suporte logístico – em eventos de carácter especificamente partidário.

Até na ficção existe sempre, por pudor, uma cabine telefónica entre o Clark Kent e o Super-Homem. Ora Carlos César faz tudo para que a sua dupla condição de Presidente do PS/A e de Presidente do Governo Regional sejam indistinguíveis.

Esta situação não pode, evidentemente, ocorrer ao longo de todas as visitas estatuárias que ainda estão por realizar. Neste âmbito, espero que o Partido Socialista evite, já na próxima visita estatutária à Ilha do Pico, a confusão entre Partido e Governo, algo que não é digno de uma democracia consolidada como a nossa.

“Diga Lá, Excelência”

A nossa primeira constatação – não significando, da nossa parte, qualquer tentativa de interferência no trabalho jornalístico dos dois profissionais em causa – é que a entrevista foi mal conduzida do ponto de vista factual, notando-se, em demasia, o desconhecimento da realidade política regional.

Aliás, este é um problema recorrente da comunicação social continental que, ou omite factos importantes da actualidade regional, ou – demasiadas vezes – a trata com erros factuais importantes.

Sinteticamente referenciamos, nesta entrevista, os seguintes erros factuais:

A insistência da jornalista – referiu o facto 4 vezes – em referenciar a actual candidatura de Carlos César como sendo a terceira. O próprio Carlos César sentiu-se, após uns minutos de omissão, impelido a rectificar esta afirmação. Mesmo após esta correcção, a jornalista continuou a insistir nos três mandatos que tinha, previamente, interiorizado. O facto não é, em si, muito grave, mas tirou-lhe a oportunidade de referenciar que esta é a segunda reincidência de Carlos César no incumprimento da promessa de abandono do poder regional. Este desconhecimento também não lhe permitiu contrapor à afirmação de Carlos César de que tinha proposto – no âmbito da revisão do estatuto – a limitação de mandatos do Presidente do Governo Regional a um máximo de três, o facto de ter criado uma cláusula de excepção que lhe permite candidatar-se ao quarto. O limite dos três mandatos fica para quem vier a seguir.

A insistência da jornalista em falar de um “Governo do Continente”, facto igualmente grave, na medida que pode evidenciar o desconhecimento de que o Governo da República não exerce, também aqui, as suas funções constitucionais. Menos graves, mas também patentes, estiveram limitações de informação em relação à diferenciação estatutária entre a Madeira e os Açores, ao défice da área da saúde na Região (impunha-se contrapor a Carlos César, a respeito da sua aparente indiferença pelas despesas no sector, perguntar como pensa ele resolver o galopante desequilíbrio introduzido no orçamento da Região pela área da saúde), da maternidade do Pico, que Carlos César omitiu, etc.

Na nossa perspectiva, estes, e muitos outros factos, prejudicaram factualmente a entrevista e permitiram a Carlos César fazer um autêntico passeio. Não nos cabe a nós efectuar a entrevista, como é evidente, mas a análise que fazemos é que a mesma se tornou muito fácil e superficial devido ao desconhecimento da realidade regional patenteado por quem tinha a função de questionar.

Em relação ao resto, viu-se um Carlos César tão descontraído e à vontade que se permitiu dar, de si próprio, a imagem de um estadista tutelar dos novos socialistas da República, algo distantes, segundo o próprio, dos tradicionais valores socialistas, nomeadamente nas questões sociais, com destaque para a área da saúde.

Na questão do transporte dos suspeitos de integrar a rede terrorista da Al Qaeda para Guantánamo – com escala nas Lajes – Carlos César considerou que a mesma era previsível e que, a confirmar-se, se trata de algo lamentável.

Este reconhecimento de Carlos César motiva que lhe coloquemos as seguintes questões:

Se a utilização da base das Lajes era previsível como escala, por que razão não tomou qualquer atitude política ou institucional para a impedir?

Se considera inaceitável esta situação, por que razão não se conhece qualquer iniciativa do Governo Regional tendente a obter o esclarecimento dos factos que são imputados ao Governo da República, uma vez que os mesmos foram, eventualmente, perpetrados em território açoriano?

Quer-nos parecer que Carlos César se quer acomodar, neste assunto, na tranquila posição da retórica inerte, mas não deixarei de lhe imputar responsabilidades políticas e éticas, por omissão ostensiva, se todos estes factos se vierem a confirmar.

sábado, 9 de fevereiro de 2008

Por Que Razão os Açorianos Não São Mais Unidos?

Um órgão de comunicação social regional perguntou-me, há dois anos, o seguinte:

Porque razão os Açorianos não são mais unidos?

Respondi o seguinte:

Na medida em que já exerci funções docentes em cinco ilhas, tendo vivido durante alguns anos em cada uma delas, posso afirmar que o povo açoriano possui características culturais e sociais que lhe fornecem uma grande homogeneidade, apesar da extraordinária dispersão geográfica e da unidade política e administrativa ser tão recente. Existem, no entanto, alguns factores que, na minha opinião, impedem que essa união possa ser ainda mais forte. Passo a enumerá-los:

1) A ausência de um projecto político que assuma como prioridade política a construção dos Açores como um espaço cultural e social realmente diferenciado do espaço Continental, vertebrado por um conjunto de características que o unificam nas vertentes cultural, política, religiosa e social (ao nível dos costumes, valores predominantes, interacção social, etc.);

2) A institucionalização de um sistema político demasiado fragmentado na vertente de ilha – decorrente do sistema eleitoral vigente – facto que pulverizou o discurso político em lógicas locais (um extraordinário caldo de cultura para o incremento de um certo bairrismo de raiz claramente populista);

3) A estagnação das ligações aéreas e marítimas de passageiros. Demasiado caras no primeiro caso e quase completamente inexistentes – à escala regional – no segundo caso. Tudo isto faz com que apenas uma reduzidíssima elite conheça, de facto, todo o espaço regional ou se movimente nele com frequência;


4) A fragilidade dos grupos económicos regionais, facto que impede a criação de projectos económicos privados com uma escala e uma mobilidade, de meios e pessoas, verdadeiramente regional.

sexta-feira, 8 de fevereiro de 2008

História, Geografia e Cultura Açoriana

O Secretário Regional da Educação e Ciência apresentou, na última reunião do Conselho Coordenador do Sistema Educativo Regional, realizada no último mês de Janeiro, uma proposta de Revisão do Currículo Regional do Ensino Básico que será apresentada, ainda no decorrer da actual legislatura, na Assembleia Regional.

A proposta da Secretaria Regional da Educação possui três eixos fundamentais:

1) Redução do número de disciplinas no segundo e terceiro ciclos;

2) Aumento da carga horária disciplinar anual, nomeadamente no âmbito de disciplinas nucleares como a língua portuguesa e a matemática;

3) Flexibilização do horário escolar e o aumento da capacidade de oferta extracurricular das escolas no sentido de compatibilizar o horário destas com o horário laboral das famílias.


No essencial, apoiamos este núcleo de ideias fundamentais, sendo que a proposta fica aquém das nossas expectativas em termos de simplificação curricular. Nomeadamente, defendemos a criação de uma disciplina unificada nas áreas das ciências sociais e humanas, da educação artística e tecnológica, das ciências da natureza e da área de formação pessoal e social.

Esta situação configuraria a existência de um currículo constituído por apenas por 9/10 disciplinas no segundo e terceiro ciclos do ensino básico. Esta é a situação padrão em todos os países com modelos educativos de sucesso.

A actual atomização disciplinar do nosso currículo do ensino básico – a título de exemplo, refere-se aqui o caso do 7.º ano que é actualmente constituído por 16 disciplinas – é algo de absolutamente único no Continente Europeu, nomeadamente nos países com sistemas educativos de sucesso. Os problemas do nosso sistema educativo não se restringem ao desenho curricular, mas – não temos dúvidas – deve-lhe ser atribuído uma parte importante do nosso elevado índice de insucesso.

A nossa discordância, em relação ao projecto apresentado pela Secretaria Regional da Educação, centra-se na ausência de uma clara aposta na leccionação unificada da História, Geografia e Cultura dos Açores. Esta proposta mantém a leccionação, destes conteúdos, dispersa pelas várias disciplinas do currículo. Solução que, comprovadamente, não funciona.

Que sabem os nossos alunos sobre a nossa história, para além das temáticas da descoberta, da resistência ao domínio filipino na ilha Terceira ou do nosso papel no processo de instauração do liberalismo?

Que sabem os nossos alunos sobre a nossa organização política e administrativa?

Que sabem os nossos alunos da fauna e flora dos Açores?

Que sabem os nossos alunos da evolução política, económica e social vivida no âmbito do actual processo autonómico?

Que sabem os nossos alunos da geografia do nosso Arquipélago?

Que sabem os nossos alunos dos grandes vultos culturais, nas diferentes áreas de criação artística, que os Açores já deram ao Mundo?

Que sistematização global, sobre a nossa especificidade histórica e cultural, é fornecida aos alunos açorianos?

A nossa autonomia nunca estará completa enquanto não decidirmos transmitir, aos nossos filhos, a herança histórica e cultural que nos caracteriza – no âmbito da nação portuguesa – como Povo.

A nossa autonomia não resulta apenas da distância geográfica. A nossa autonomia fundamenta-se na nossa especificidade enquanto Povo com uma herança histórica e uma matriz cultural específica. Tudo isto tem de ser transmitido, de forma sistemática e determinada, no nosso sistema educativo.

Na nossa perspectiva, este desiderato só se alcançará quando decidirmos integrar, no nosso currículo, uma disciplina unificada sobre conteúdos regionais. A nossa proposta é que se crie - em todos os ciclos de escolaridade - a disciplina de História, Geografia e Cultura Açoriana.

O Sr. Secretário Regional de Educação afirma que o processo de reformulação do currículo regional ainda está em aberto. Esperamos, com esta intervenção, dar um contributo válido para que, finalmente, se tenha a coragem política para a avançar com a criação desta disciplina.

Não é uma ideia original. A maioria das regiões europeias, dotadas de autonomia política, já criou, sem complexos, disciplinas regionais desta natureza, visando a valorização do seu rico e específico património cultural.

Espero que, no âmbito da discussão da revisão do currículo regional, que agora se inicia, surja, por parte de amplos sectores da sociedade açoriana, a reivindicação da criação desta disciplina.

quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

Perspectivas de Futuro para a Ilha do Corvo

Um dos dados do censo de 2001 que mais espantou os analistas foi o facto de a ilha do Corvo ser a única – com a excepção óbvia de São Miguel – que resistiu à verdadeira sangria demográfica que afectou, ao longo da década de noventa, as ilhas açorianas.

Os dados demográficos parciais que possuímos sobre a evolução demográfica dos últimos seis anos, permitem-nos concluir que o despovoamento de grande parte das ilhas açorianas continua a registar-se a um ritmo dramático.

O mesmo sucede na área económica. Nessas ilhas o investimento privado diminuiu extraordinariamente e o investimento público é residual, carecendo, para cúmulo, de uma perspectiva estratégica minimamente coerente.

Os próximos anos serão, certamente, dramáticos para muitas das nossas ilhas, na medida em que a perda de dimensão demográfica provocará, inevitavelmente, a contracção do mercado interno e de todos os indicadores que lhe podemos associar: emprego, investimento privado e público, acessibilidades, infra-estruturas, etc.

Neste processo é toda a pluralidade histórica e cultural da Região que está em causa. De acordo com algumas projecções, a ilha de São Miguel poderá concentrar – no curto espaço de duas décadas – cerca de 80% da população dos Açores. Com uma população desta dimensão será cada vez mais difícil, a qualquer Governo Regional, explicar à opinião pública investimentos de grande dimensão em ilhas decadentes e despovoadas.

A única opção que nos resta é enfrentar o problema com a urgência e o dramatismo que o mesmo efectivamente possui. É necessário concentrar, nestas ilhas, o essencial do investimento público, redireccionar fluxos turísticos e aplicar medidas excepcionais para fixar os jovens nas suas ilhas de origem

Neste difícil cenário para a coesão económica da Região, a ilha do Corvo logrou resistir e até aumentar a sua população. Esta excepcionalidade corvina tem, na minha opinião, três ordens de razões fundamentais:

1) A ilha do Corvo partia de valores extremamente baixos (é sempre mais fácil registar aumentos quando se parte de valores muito residuais). Desde finais do século XIX que a sua população vinha declinando de forma quase ininterrupta. Na década de oitenta do século XX atingiu os valores mais baixos da sua história (pouco mais de três centenas de habitantes). No âmbito deste cenário catastrófico, bastou ao Governo Regional a realização de algumas infra-estruturas básicas para alterar, significativamente, este quadro económico (construção da aerogare, da escola e o aumento do cais do Porto da Casa, por exemplo);


2) A localização de alguns serviços regionais e o aumento exponencial do quadro de pessoal da Câmara Municipal. Somados, estes dois factores permitiram absorver muita mão-de-obra local e garantir, a muitas famílias, um sustento fixo.

3) Finalmente, embora de forma algo mais marginal, os apoios dos fundos europeus à lavoura permitiram aumentar, significativamente, os rendimentos das famílias ligadas, inteira ou parcialmente, a esta actividade.

O grande desafio que se coloca actualmente à ilha do Corvo é o de continuar a crescer em circunstâncias que hoje parecem muito mais difíceis (uma Lei das finanças locais muito penalizadora, o decréscimo, muito significativo, do investimento público e a estagnação – em termos de oferta de emprego – da administração regional aqui localizada).

Neste quadro de análise, a resposta a este desafio parece evidente. É necessário iniciar um novo ciclo de investimentos em grandes infra-estruturas (agora também em áreas como o desporto, a cultura e o lazer), melhorar as acessibilidades, localizar mais serviços regionais, reforçar a eficácia e a capacidade de gestão dos órgãos de poder local e potenciar o crescimento das três grandes áreas económicas em que a ilha possui evidentes vantagens: turismo, lavoura e pesca.

terça-feira, 5 de fevereiro de 2008

Descobrir o Corvo

Viver no Corvo é um privilégio só ao alcance de pouco mais de 4 centenas de pessoas. Neste preciso momento em que escrevo houve-se um silêncio completo e puro. O horizonte é prateado e infinito. Sem o ruído da civilização, o mundo parece mais simples e Deus – esse esquecido – mais próximo. O Corvo contínua a ter, de certa forma, esse ambiente de mosteiro que Raul Brandão descreveu, de forma genial, no início do século passado.

A ilha permanece a eterna desconhecida de sempre. Dezenas de turistas visitam-na diariamente no Verão e, após não mais de duas horas de permanência, ganham o direito a conhecer… o Caldeirão. Os organizadores desses rapidíssimos safaris vendem-lhes a ideia que esse tempo é mais que suficiente para conhecer pormenorizadamente a pequeníssima ilha do Corvo.

Pobres diabos! Vêem de tão longe e só lhes oferecem aquilo que qualquer postal banal lhes pode dar. A visão de um sítio já visto, sem surpresas e sem alma. Daqui a uns dias – já os antevejo – contarão pormenorizadas descrições, aos vizinhos e familiares, da extraordinária visita que fizeram a este recôndito lugar.

Na verdade, não estiveram aqui. Não se pode estar no Corvo e ter hora de embarque marcada. Estar no Corvo implica aceitar o fim da noção de tempo e sentir todo o peso e o espírito indomesticável do vento e do mar. Implica ver a natureza ganhar, vezes sem conta, a batalha da vontade a barcos e aviões. Tudo isto com a resignação e a fé de quem se habituou, ao longo de cinco séculos, a olhar o mar e a vislumbrar a certeza que – só não se sabe bem quando – surgirá, por fim, fatal como o destino, uma nova silhueta no horizonte.

Se tivesse estado no Corvo, o turista teria, certamente, admirado a incrível resistência do corvino às regras e à burocracia do Mundo. Votados, durante séculos, ao mais completo abandono, habituados a enfrentarem sozinhos as fomes endémicas e a incrível vitalidade dos elementos, os corvinos interiorizaram uma indisfarçável desconfiança em relação ao Estado e às suas imposições. Amam a simplicidade das coisas e não reconhecem, a nenhum homem, um estatuto superior ao seu.

Se tivesse estado no Corvo, o turista poderia ter saboreado essa sensação irrepetível, leve e transcendente, do usufruto da liberdade e de ter integrado uma espécie de rebelião colectiva contra muitas das enfadonhas regras da nossa sociedade burocrática.

Poderia ter admirado a incrível e arreigada noção igualitária dos corvinos. Os ricos, cultos e poderosos deste Mundo são aqui tratados sem os salamaleques da nossa sociedade de salão. Não conheço nenhum outro sítio no Mundo em que os homens e mulheres sejam mais iguais. Isto é algo extraordinário, sobretudo se pensarmos que, por utopias destas, morreram, ao longo dos séculos, muitos milhões de homens e mulheres.

Marx teria aqui, certamente, vislumbrado um pouco da sua utopia. Mas o Corvo também é, à sua maneira, uma espécie de teocracia. A Sua presença sente-se por todo o lado: nas arribas imponentes, na beleza verde dos campos, no infinito do mar, no canto das milhares de aves da ilha e no frente a frente bíblico que a rareza dos homens, em contraposição à omnipresença da natureza, propicia aqui, de forma inelutável.

A Casa da Ilha

No horizonte, através da janela do pequeno avião que liga, três vezes por semana, a ilha do Corvo ao mundo, é visível uma minúscula forma oval.

O viajante sabe que comprou o bilhete para aquele destino. Porventura já leu e ouviu qualquer coisa sobre a ilha do Corvo. Coisas triviais: a mais pequena dos Açores, isolada, triste e, noutros tempos, infestada de piratas. Sabe que ali vivem 400 almas e que para além daquele pedaço de terra a bandeira portuguesa deixa de flutuar.

O destino tem a atracção do fim. Qual é o viajante que não quer saborear o prazer de chegar ao derradeiro promontório? Talvez, com um pouco de utopia, descobrir a terra onde a civilização fraqueja.

Procuram algo diferente. Um sítio de ausências, uma imagem do passado onde o tempo não passou.

Durante a viajem descobriram a monotonia do mar. Habituados ao salpico de ilhas do Grupo Central, perscrutam o horizonte à procura da mais pequena. Estranham a demora e a distância.

Por fim chegam. No horizonte uma ilha quase estéril, sem árvores e sem pessoas. No fim, só no fim, a pista e as casas.

É uma imagem fascinante. No meio do nada surge um pequeno povoado improvável. A civilização está aqui. Computadores no terminal, polícias, bombeiros, automóveis e a anarquia, bem portuguesa, do estacionamento junto da aerogare.

Depois a Vila. Impressiona o aconchego. As casas encontram-se, literalmente, em cima umas das outras. No entanto, por ténue que seja, existe sempre um murinho ou uma canadinha a separar as habitações. Como se aqui se tivesse tentado a aliança improvável entre o individual e o comunitário. Paradoxal, mas real.

Aos forasteiros incomoda a falta de nitidez das fronteiras. Este é um mundo que, desde o princípio, deixam de perceber.

É um mundo comunitário, mas não é só isso. As marcas do individualismo estão lá e o código é simples de decifrar. A base de tudo é a confiança, que aqui é tão natural como a respiração. Por isso não se fecham as portas à chave. Por isso, atrás das paredes comuns, não se ouve, nem se escuta o alheio. O individualismo pode sobreviver, sem muros de betão.

No casco antigo da Vila sobrevive, inamovível, a estrutura secular das casas. São em norma, caracterizadas pela existência de dois pisos desenhados de forma rectangular ou em “L”.

Internamente, no entanto, as casas do Corvo apresentam uma particularidade em relação ao resto da Região. As lojas e a cozinha localizam-se no piso inferior, os quartos no superior. A diferença está na localização da cozinha que, ao contrário do que sucede nas outras ilhas dos Açores, é concebida junto das lojas.

No exterior, a alvenaria de pedra encontra-se à vista, assim como o acesso ao primeiro piso que se processa através de uma escadaria exterior. A cobertura é em telha de meia-cana apoiada numa estrutura, quase sempre, rudimentar.

Ao contrário da profusão de objectos decorativos que caracterizam os novos nichos urbanos – de gosto mais que duvidoso – a decoração interior das casas do Corvo caracteriza-se pela extrema simplicidade. As casas do Corvo são a herança duradoura e visível de um passado muito difícil sob o ponto de vista económico.

Isolada do mundo e submetida à mais cruel e duradoura carga fiscal da história da colonização do arquipélago – com o senhorio sempre ausente – a população corvina não criou grandes desigualdades sociais. Noutros tempos eram todos, sem excepção, muito pobres.

Existiu sempre – e persiste – uma notável igualdade social entre os corvinos. Isso mesmo se reflecte no casario do núcleo histórico em que, em regra, não são observáveis casas que se destaquem no tamanho ou na qualidade de construção.

Em suma, as casas contam a história desta ilha. Um percurso feito de incrível persistência, nas condições mais difíceis. Isolada, sem protecção militar e submetida a um regime fiscal esmagador, a população corvina sobreviveu cinco séculos graças à extraordinária união das suas gentes.

Juntos sobreviveram a tudo. Por isso é normal que tenham querido juntar-se no seu núcleo populacional. Numa área de apenas 0,7 km2 vive toda a população da ilha, em casas irmanadas numa verdadeira teia de proximidade, cumplicidade e colaboração.

A Vila é como que uma casa comum feita da união das casas de todos. A casa do Corvo nunca se compreenderá no singular. A sua natureza é comunitária no espírito e individual na posse.

segunda-feira, 4 de fevereiro de 2008

As Fechaduras do Corvo

A ilha do Corvo, situada nos confins do Atlântico português e europeu, encerra em si o mito do mistério e da impossibilidade. É uma espécie de pequena jangada milagrosamente ancorada no âmago de um Oceano interminável e poderoso.

Desde os primórdios da descoberta que é sinónimo de afirmação de um povo indómito e independente. Desde sempre, muitos, conceberam-na como uma espécie de ilhéu que devido à sua pequena dimensão e isolamento não teria condições para se manter permanentemente povoada.

Ao longo dos séculos, gerações de corvinos determinados agarram-se aos seus penhascos e, isolados de tudo e de todos, protagonizaram uma história épica de sobrevivência que moldou uma forma diferente de ser e de estar.

As histórias de um passado de meio milénio falam de uma solidariedade e de um espírito de entreajuda sem limites. O conceito de família diluiu-se, para dar lugar a um forte espírito comunitário. Para enfrentar as privações decorrentes de um isolamento extremo, todos tinham de estar unidos no ideal superior da sobrevivência.

O Estado Português, geneticamente débil, sempre foi assim: centenas de comunidades lusas – espalhadas desde a selva amazónica aos confins do Extremo Oriente – habituaram-se a contar, apenas, consigo próprias. A sua sobrevivência, em muitos casos, é obra do engenho e da extrema tenacidade dessas populações.

O corvino actual herdou uma aguda percepção da sua especificidade cultural. Sabe que, acima de tudo, é um sobrevivente secular. Os arcaísmos que persistem na sua oralidade lembram-nos que aqui a história andou mais devagar. As velhas histórias de piratas – noutros locais remetidas para os impessoais livros de história – são aqui contadas com o entusiasmo e os pormenores de quem conta uma narrativa do quotidiano.

Sim, a noção de tempo é aqui diferente. O efémero não tem lugar. As histórias que, pelo seu exotismo ou carácter extraordinário, pulsaram para fora do quotidiano fugiram às amarras impiedosas do tempo e tornaram-se intemporais. São as histórias de sempre, pertencem a todos e a todos os tempos.

Os objectos do quotidiano reflectem a realidade social e ocupacional das populações. Se logram sobreviver ao tempo e superar a concorrência desleal das inovações tecnológicas, tornam-se testemunhas privilegiadas de outros tempos e em elementos de continuidade que juntam passado e presente.

As fechaduras do Corvo são um desses elos matriciais dos tempos. Têm a beleza e a atracção dos objectos únicos. Não se encontram fechaduras com estas características no nosso espaço insular e a sua origem permanece misteriosa e discutível.São feitas de cedro zimbro, uma madeira existente na ilha. A sua estrutura tem a argúcia das coisas simples: a simetria projectada pela chave de madeira permite mover o encaixe provocado pelos vermelhos que funcionam como autênticos trincos.

A construção de uma fechadura com estas características respondeu às necessidades sentidas pela população, num determinado período da sua história. A madeira substitui, com vantagem, o metal em climas húmidos. A simplicidade da sua construção não exigia uma perícia técnica muito especializada, facto que a tornou acessível a todos.

No entanto, a sua extrema vulnerabilidade – devido à fraca resistência do material em que é construída – evidencia, de forma indirecta, a natureza peculiar da vida comunitária no Corvo. Na verdade só uma sociedade isolada e com uma forte coesão social pode conceber um instrumento de protecção dos bens privados cuja eficácia se baseia mais na confiança do que no possível carácter dissuasório do mecanismo.

A peculiar fechadura de madeira corvina é quase irrepetível, noutro lugar, nos dias de hoje. Ela representa uma exteriorização da confiança e uma crença nos outros que a generalidade das outras comunidades já perderam.É por isso que ela é emblemática da ilha do Corvo. A sua sobrevivência é um marco psicológico, um derradeiro triunfo do mundo comunitário sobre o individualismo exacerbado dos nossos dias.